Todos os post de Dra. Karen Gonçalves

A Ketamina e o Cérebro – Um promissor tratamento para a Depressão Maior

Ketamina para DepressãoA Ketamina (ou Cetamina, originada do inglês Ketamine) é um composto químico sintetizado pela primeira vem em 1962 para substituir o anestésico Fenciclidina (PCP), que apresentava diversos efeitos indesejáveis. Inicialmente, essa substancia foi testada com sucesso em animais e, a partir daí, seu uso se tornou corriqueiro na medicina veterinária em situações que envolvem cirurgias. Posteriormente, o seu uso como anestésico foi comprovado de forma eficaz em crianças e em pacientes que sofreram queimaduras graves, bem como também em procedimentos de baixo impacto, tais como endoscopias e cateterismo. O seu uso em pacientes pediátricos se mostrou mais eficaz devido ao seu efeito broncodilatador em crianças com quadro asmático e que necessitam de cirurgias. O mesmo efeito não é seguro em pacientes adultos, pois pode precipitar uma insuficiência cardíaca que pode levar a um infarto do miocárdio. Portanto, em pacientes adultos a Ketamina é mais utilizada em doses menores para efeitos de analgesia pré-operatória, diminuindo assim a necessidade do uso de doses mais elevadas de morfina no pós-operatório.

Observando-se esse efeito de analgesia, pesquisadores médicos encontraram um novo uso para a Ketamina. Como essa substância age como um antagonista NMDA, bloqueando esse receptor em um local especifico do cérebro de uma forma controlada, os efeitos positivos da Ketamina no controle da dor crônica parecem ser muito promissores, principalmente em comparação aos efeitos dos opioides (como a Morfina) e dos anti-inflamatórios não esteroides (AINES), já que essas substâncias possuem desvantagens significativas, tais como problemas sérios no sistema respiratório e toxidades renais e gastrointestinais, respectivamente.

Cerca de 10 anos após a síntese da Ketamina foi registrado o primeiro caso do uso desta substância como droga de abuso (ou de uso recreativo) em 1971 nos Estados Unidos. Provavelmente isso ocorreu devido à curiosidade de alguém que já sofria com problemas de drogadição, já que o registro da Ketamina no FDA (órgão americano de controle de drogas e alimentos) foi nomeado como “Analgésico Dissociativo”, ou seja, um medicamento que podia provocar efeitos alucinógenos. Desde então, o uso dessa substância para esses fins teve um crescimento alarmante, principalmente durante os anos de 1990, quando se popularizou em festas noturnas e “raves” na Inglaterra. Hoje em dia o uso da Ketamina nesses ambientes cresceu mais do que o uso de anfetaminas.

Diante disso, o FDA alterou o registro da Ketamina na década de 1990, classificando-a como “Droga de Abuso” e, a partir daí, ela passou a ser conhecida nas ruas como “Special K”, “Vitamina K” ou, simplesmente, “K”. Nessa condição, o seu uso é de altas doses, provocando um aumento exacerbado da excitação elétrica no sistema límbico e no córtex cerebral, como também elevando o tônus simpático dos gânglios da base e do hipocampo. Tais modificações cerebrais se apresentam como uma elevação do humor e da euforia, causando distorções visuais e auditivas, sensações eróticas e também a estranha sensação de “flutuação” sobre o próprio corpo.

Os efeitos são semelhantes aos da cocaína e da anfetamina, porém os usuários da Ketamina tendem a aumentar a dose de forma crescente após o primeiro uso, provocando alterações graves em todo o corpo, como vômitos, amnésia, redução da função motora, delírios com agitação psicomotora, taquicardia, bradicardia, hipotensão e depressão respiratória. Os efeitos cognitivos e psiquiátricos podem perdurar por dias ou semanas e, após uso frequente, pode provocar efeitos psicóticos semelhantes à esquizofrenia e, num quadro mais crítico, levar o usuário ao óbito.

Em contrapartida, estudos vêm demostrando que o uso clínico controlado da Ketamina em baixas doses pode auxiliar de forma importante no tratamento de usuários de Heroína, uma droga de abuso sintética, e também, da mesma forma, pode auxiliar o tratamento de alcoolistas.

Há alguns anos, em 2006, o Dr.Carlos Zarate, Chefe do Núcleo de Terapêutica Experimental e Fisiopatologia e Chefe da Seção de Neurobiologia e Tratamento de Transtornos de Humor e Ansiedade, do conceituado NIMH (Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos), formou um grupo de estudos avançados e pesquisas randomizadas sobre o uso da Ketamina no tratamento da Depressão Maior (TDM), um transtorno específico do qual os portadores raramente obtém melhoras com o uso de antidepressivos. Tais estudos cominaram na comprovação dos efeitos benéficos da Ketamina em baixa dose para o tratamento da remissão depressiva nesses pacientes.

A ação rápida da Ketamina no tratamento da Depressão Maior foi obtida com administração de doses únicas intravenosas e subanestésicas equivalentes a 0,5 mg/kg, durante 40 minutos. Mais de 70% dos pacientes responderam com 50% de melhora 24 horas após a infusão, e cerca de 35% mostraram uma resposta sustentada após uma semana. O único problema apresentado se restringe aos efeitos alucinógenos da Ketamina que, mesmo em baixas doses, ainda é visível. Sendo assim, o FDA aprovou o seu uso nesta categoria somente em ambientes ambulatoriais controlados, ou seja, as aplicações só podem ser feitas em pacientes em Clínicas especializadas na forma “Off-Label”, já que o FDA só irá incluir o uso da Ketamina para estes fins quando os efeitos alucinógenos forem eliminados da substância. Trabalhos neste sentido já estão sendo realizados desde 2012 por um laboratório farmacêutico internacional que pretende lançar um medicamento exclusivo para Depressão com base na Ketamina sem os efeitos alucinógenos, com uso oral (comprimidos), ao invés da atual aplicação intravenosa. Provavelmente, até 2025 este medicamento já estará disponível. Por enquanto, pacientes com Depressão Maior e com Transtorno de Ansiedade podem se beneficiar do tratamento Off-Label com a Ketamina injetável em várias Clínicas nos Estados Unidos e também aqui no Brasil, como por exemplo a Clínica Psiquiátrica OHR em São Paulo, dirigida pelo Dr. Ivan Barenboim, de quem eu mesma fui paciente, já que, embora eu seja Psiquiatra, também sofri durantes muitos anos com a Depressão Maior e, após me submeter ao tratamento com Ketamina, obtive uma melhora significativa. Infelizmente, há poucas Clínicas aqui no Brasil oferecendo este Tratamento e agora a Clínica Psiquiátrica Dra. Karen, a minha Clínica em Sorocaba, SP, também está oferecendo a Cetamina para tratar pacientes que sofrem com a Depressão. Somos a quinta Clínica do Brasil e a primeira do interior de São Paulo.

TDAH

TDAH

O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno comportamental, caracterizado por sintomas de desatenção, impulsividade e hiperatividade.

Estudos nacionais e internacionais situam a prevalência do TDAH entre 3% e 6%, o que significa que, na média, há uma ou duas crianças com TDAH em cada sala de aula.

Como a doença muitas vezes pode resultar em comportamento conturbador em sala de aula, o TDAH é identificado frequentemente pela primeira vez na escola.

Antigamente era conhecido como “Disfunção Cerebral Mínima“, e mais tarde passou a chamar-se “Síndrome Infantil da Hiperatividade“. Só nos anos 70, com o reconhecimento da ausência de controle de impulsos e do componente do deficit de atenção, passou então a ter a denominação a qual perdura até os dias de hoje.

Ao contrário do que se pensava, o TDAH não é superado na adolescência. Os sintomas, em alguns casos parecem ser minimizados nesta fase pelo fato de algumas pessoas desenvolverem estratégias para lidar com essa condição, e dessa maneira acabam por atenuar os sintomas. Porém cerca de 65% das crianças diagnosticadas como portadoras do Transtorno, continuam com os sintomas ao atingirem a idade adulta.

Apesar de não haver exames de imagem que comprovem a existência do Transtorno, é consenso da comunidade científica a existência do mesmo.

Estudos apontam a predisposição genética e a ocorrência de alterações nos neurotransmissores (dopamina e noradrenalina) que estabelecem as conexões entre os neurônios na região frontal do cérebro como as principais causas do Transtorno do Déficit de Atenção. Algumas pesquisas indicam que fatores ambientais e neurológicos podem estar envolvidos, mas ainda não há consenso sobre o assunto.

Os sintomas do TDAH geram reflexos negativos no convívio social e familiar, assim como no desempenho escolar ou profissional dos portadores do transtorno. Esses sintomas podem manifestar-se em diferentes graus de comprometimento e intensidade.

Quando predomina a desatenção, os pacientes apresentam dificuldade maior de concentração, de organizar atividades, de seguir instruções e podem saltar de uma tarefa inacabada para outra sem nunca terminar aquilo que começaram. São pessoas que se distraem com facilidade e frequentemente esquecem o que tinham para fazer ou onde colocaram seus pertences. Não conseguem também prestar atenção em detalhes, demoram para iniciar as tarefas e cometem erros por absoluto descuido e distração, o que pode prejudicar o processo de aprendizagem e a atuação profissional.

Nos casos em que prevalece a hiperatividade, os portadores do distúrbio são inquietos, agitados e falam muito. Dificilmente conseguem participar de atividades sedentárias e manter silêncio durante as brincadeiras ou realização dos trabalhos. Se é a impulsividade que se destaca os sinais mais marcantes são a impaciência, o agir sem pensar, a dificuldade para ouvir as perguntas até o fim, a precipitação para falar e a intromissão nos assuntos, conversas e atividades alheias.

Na adolescência e na vida adulta, os sintomas de hiperatividade costumam ser menos evidentes, mas as outras dificuldades permanecem inalteradas e os prejuízos se acumulam no dia a dia com reflexos negativos sobre a autoestima.

Diagnóstico

Para efeito de diagnóstico, que é sempre clínico, os sintomas devem se manifestar na infância, entre seis e nove anos de idade, pelo menos em dois ambientes diferentes (casa, escola, lazer, etc.), durante seis meses, no mínimo. Devem também ser responsáveis por desajustes e alterações comportamentais que dificultam o relacionamento e a performance dos portadores nas mais diversas situações. Avaliações precipitadas podem dar origem a falsos positivos que demandam a indicação desnecessária de medicamentos.

Tratamento

O tratamento varia de acordo a existência, ou não, de comorbidades ou de outras doenças associadas. Basicamente, consiste em psicoterapia e na prescrição de metilfenidato, um medicamento psicoestimulante, e de antidepressivos. Crianças podem exigir os cuidados de equipe multidisciplinar, em função dos desajustes pedagógicos e comportamentais associados ao TDAH.

Em geral, os efeitos benéficos da medicação aparecem em poucas semanas e as reações adversas – insônia, falta de apetite, dores abdominais e cefaleia – são leves e ocorrem no início do tratamento, enquanto o organismo não desenvolveu tolerância a essas drogas.

Recomendações

É importante admitir que:

* as falhas de atenção e a hiperatividade de algumas crianças podem não ser características do temperamento e personalidade, nem de má educação, mas sintomas de uma doença que pode ser controlada;

* não é má vontade, mas os portadores do Transtorno realmente têm enorme dificuldade para organizar as atividades do dia a dia, manter horários e planejar o futuro;

* a necessidade de desenvolver algumas técnicas para compensar as dificuldades próprias da TDAH (uso de agenda, lugar fixo para guardar os objetos, lembretes colocados em posições estratégicas e em quadros de avisos, lista de tarefas e dos compromissos diários e semanais) exige muito esforço e disciplina;

* pais e professores devem manter-se informados sobre as características da doença e intervenções que podem ajudar os pacientes a superar suas limitações;

*a psicoterapia pode representar um caminho eficaz para a recuperação da autoestima, quase sempre comprometida pelos sentimentos de fracasso e frustração provenientes das dificuldades de lidar com situações rotineiras.

Sabemos que a maioria dos pais já ouviu falar em TDAH. Mas não devemos esquecer que a maioria deles, quando ouve esse termo lembra, com freqüência, de um menino pequeno e agitado. Dificilmente alguém pensa numa menina.

Isto acontece porque a maior parte dos meninos com TDAH é facilmente identificável, seja na sala de aula, seja no lazer e, com mais freqüência, são levados para uma avaliação. Por outro lado, a maior parte das escalas e questionários de avaliação enfatizam os aspectos da hiperatividade, da impulsividade e do comportamento desafiador, que são fatores típicos dos meninos. Diante disso, apenas as poucas meninas que são parecidas com esses meninos, em termos de comportamento, é que são levadas a alguma avaliação médica ou psicológica.

Com isso, muitas meninas não estão sendo diagnosticadas porque seus sintomas se mostram diferentes. Uma grande diferença é que as meninas são menos rebeldes, menos desafiadoras, em geral menos “difíceis ” que os meninos. Mas “ser menos difícil” em vez de ajudar, acabou só dificultando o reconhecimento do problema.

Quando meninos causam frequentes problemas com a disciplina, em casa ou na escola, rapidamente se procura uma orientação. As meninas, por serem mais cordatas, dificilmente são identificadas. E assim ficam prejudicadas em vários aspectos de suas vidas.

Ainda assim, as meninas com TDAH não são todas iguais. Quando seu comportamento é parecido com o TDAH em meninos, o reconhecimento é mais fácil. Mas mesmo as que são do tipo Misto ou do tipo Predominantemente Hiperativo-Impulsivo, nem sempre são tão parecidas com os meninos. E é aí que elas ficam sem diagnóstico.

“Meninas Levadas” com TDAH

Frequentemente as meninas hiperativas são “levadas“. São fisicamente ativas, com inclinação para atividades mais arriscadas como subir em árvores, exploração e brincar com os irmãos ou com os meninos da vizinhança. Podem gostar de futebol, natação ou andar a cavalo e, na maioria dos casos, são menos atraídas pelas atividades consideradas “femininas“. Mas, diferentemente dos meninos com TDAH, essas meninas são mais cooperativas em casa e podem se esforçar muito para agradar os professores na escola. A caligrafia pode ser ruim, são frequentemente desorganizadas, quase sempre estão atrasadas e seu quarto é uma bagunça. Mas em vez de suspeitarem de TDAH, pais e professores as vêem apenas como indisciplinadas e pouco inclinadas para o estudo.

“Sonhadoras” com TDAH

As meninas com o tipo Predominantemente Desatento são frequentemente sonhadoras e tímidas. Sua desatenção pode passar desapercebida na escola porque elas se esforçam muito para não chamar a atenção sobre si mesmas. Muitas meninas “quietinhas” com TDAH parecem estar ouvindo seus professores, enquanto suas mentes divagam a milhas de distancia dali. Essas meninas sempre parecem ansiosas em relação a escola. Podem ser esquecidas e desorganizadas em relação ao dever de casa e ficam preocupadas quando as datas de entrega de trabalhos se aproximam. Podem ir para o quarto fazer o dever de casa e ficar sentadas sonhando em silencio até que se assustam com alguém entrando. Podem parecer facilmente sobrecarregadas e operar em “marcha lenta“. Algumas são ansiosas ou depressivas e são vistas erradamente como menos inteligentes do que realmente são.

“Faladeiras” com TDAH

Um terceiro tipo é a combinação dos tipos Hiperativo e Desatento. Apesar de terem um nível de atividade muito mais alto que as “sonhadoras“, elas não são necessariamente “levadas“. É comum serem mais faladeiras, mais tagarelas do que propriamente hiperativas. Costumam ser excitáveis e muito emotivas. Quase sempre conversam em sala de aula e tem dificuldade em ficar quietas mesmo quando são disciplinadas quanto ao falar. Às vezes tem dificuldade em narrar um fato, uma história ou contar um filme porque com freqüência esquecem detalhes, voltando a narrativa e confundindo o ouvinte. Ou seja, o discurso é muito confuso porque têm dificuldade em organizar seus pensamentos antes de começar a falar. Apesar disso, podem também exercer papel de líder. Elas são ativas, falantes e gostam de estar por perto, no meio do movimento. Suas amizades podem ser mais dramáticas, repletas de reações exageradas e discussões. Essas meninas podem adotar uma personalidade superficial, fútil, para disfarçar a desorganização e o esquecimento. Na adolescência podem compensar a pobre performance acadêmica tornando-se muito populares e correndo riscos de se viciarem em álcool, cigarros e drogas, como também iniciarem a vida sexual ativa mais cedo.

Meninas muito inteligentes com TDAH

Pode ser mais difícil descobrir quando meninas muito inteligentes têm TDAH. Quanto mais brilhante, mais tardiamente os problemas acadêmicos tendem a aparecer. Muitas meninas com QI  (Coeficiente de Inteligência) acima da média podem manter-se academicamente bem até chegarem ao nível secundário, ou mesmo à faculdade. À medida que a vida escolar se torna mais exigente e complicada nos níveis superiores, seus problemas com a concentração, organização e conclusão tem maiores probabilidades de aparecer.

Portanto, se seu filho, filha, sobrinho, sobrinha ou qualquer outra criança que você mantenha contato e que esteja na faixa etária propicia para o diagnóstico, esteja manifestando sintomas que se assemelham aos citados aqui, procure um Médico Psiquiatra que a encaminhará, caso necessário, à um profissional que trabalhe com o método de Psicoterapia mais adequado ao tratamento da TDAH, na hipótese da doença ter sido devidamente diagnosticada.

psicoses2

Psicoses

Autor:    Dr. Eduardo Sörensen Ghisolfi –  CRM  25101  RS

O termo Psicose tradicionalmente significa a perda do teste da realidade e comprometimento do funcionamento mental, manifestando-se por delírios, alucinações, confusão e comprometimento da memória. No decorrer desta segunda metade do século, dois outros significados se agregaram ao conceito original.

Na utilização psiquiátrica mais comum do termo, “psicótico” pode significar também um comprometimento grave do funcionamento social e pessoal, caracterizado por retração social e incapacidade para desempenhar as tarefas e papéis habituais. Outro uso do termo é, às vezes, encontrado para especificar o grau de regressão egoica como critério para uma doença psicótica.

De acordo com o glossário da Associação Norte-Americana de Psiquiatria (American Psychiatric Association), o termo psicótico refere-se a um amplo comprometimento do teste da realidade. Pode ser utilizado para descrever o comportamento de um indivíduo em um determinado momento, ou um transtorno mental no qual, em algum momento do seu curso, todos os indivíduos com o transtorno apresentem tal prejuízo no teste da realidade.

Falar em comprometimento do teste da realidade significa que o indivíduo avalia incorretamente a acuidade das suas percepções e pensamentos, realizando inferências incorretas acerca da realidade externa, ainda que em face de evidências contrárias.

Contudo o termo psicótico não se aplica a distorções menores da realidade que decorram de juízo relativo. Por exemplo, uma pessoa deprimida que subestima suas conquistas e qualidades não deveria ser considerada psicótica, enquanto aquela que julga ser culpada de uma catástrofe natural, sim.

A evidência direta do comportamento psicótico é a presença de delírios ou alucinações sem discernimento de sua natureza patológica. Às vezes o comportamento pode estar tão amplamente desorganizado que se pode, a priori, inferir um prejuízo importante do teste da realidade, quando a fala é amplamente incoerente e o indivíduo, em geral agitado, não demonstra notar a incompreensibilidade do seu discurso.

É possível que indivíduos com transtorno mental não-psicótico venham a exibir, embora mais raramente, sintomas psicóticos. Tal fato pode ser encontrado, por exemplo em transtornos graves do humor. Neste caso há necessidade de especificar, assim por exemplo: depressão com psicose.

No DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), os transtornos psicóticos incluem os transtornos invasivos do desenvolvimento, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno esquizoafetivo, transtorno delirante, transtorno psicótico breve, transtorno psicótico compartilhado, transtorno psicótico devido a uma condição médica geral, transtorno psicótico induzido por substância e transtorno psicótico sem outra especificação.

É importante lembrarmos a diferença entre síndrome e transtorno. Síndrome é uma condição que se caracteriza por uma coleção de sinais e sintomas com certa correlação, com uma certa homogeneidade, mas que, contudo, apresenta certas variações importantes. Podemos falar numa síndrome psicótica que é caracterizada pelas alterações básicas descritas nesta introdução e que engloba por sua vez vários transtornos ou doenças, que apresentam as características básicas da síndrome mas que diferem entre si com relação a outros critérios, digamos assim, secundários, como tempo de duração, concomitância de sintomas de outras síndromes, fatores e nexos causais, ou mesmo características mais particulares.

SITUAÇÕES QUE SUGEREM UMA SÍNDROME PSICÓTICA: (como quadro principal ou concomitante)

  • Surgimento mais ou menos súbito de evidentes perturbações da sensopercepção (alucinações de qualquer tipo), particularmente quando acompanhadas de alterações do conteúdo do pensamento (idéias delirantes) e do curso do pensamento (incoerência na organização das idéias), com desorientação no espaço e no tempo, em relação à outras pessoas e quanto à própria pessoa;
  •  Desconfiança exagerada, isolacionismo, marcado desinteresse pelas atividades sociais, hostilidade e agressividade;
  •  Humor triste acentuado, insônia, idéias e tentativas de suicídio, descuido da higiene pessoal, emagrecimento, idéias de ruína e auto-acusação;
  • Humor eufórico, insônia, excitação ou agitação psicomotora, idéias ou planos grandiosos, loquacidade extrema;
  •  Marcado alheamento quanto ao mundo externo, com nítido predomínio do mundo interno; embotamento afetivo, conduta bizarra ou estranha.

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL NAS MANIFESTAÇÕES PSICÓTICAS:

Antes mesmo de mencionarmos os transtornos definidos pelo DSM-IV na respectiva seção, é necessário que conheçamos alguns outros conceitos, que são fundamentais para auxiliar o raciocínio diagnóstico, para que tenhamos uma definição operacional de termos correntemente utilizados:

Psicose (pode-se ler Síndrome Psicótica): nítido prejuízo do teste da realidade evidenciado por delírios, alucinações, pensamento incoerente. Nítido afrouxamento das associações, pobreza do conteúdo do pensamento, pensamento nitidamente ilógico, conduta bizarra ou grosseiramente desorganizada, ou ainda catatônica.

Síndrome Cerebral Orgânica (alucinose ou delirium e outras): havendo Psicose e fator orgânico conhecido pela história e/ou exames complementares ou história de abuso de substâncias psicoativas.

Simulação de Psicose: sintomas sob o controle voluntário e com objetivos obviamente reconhecíveis.

Transtorno Factício/Pantomimia, Síndrome de Münchausen: objetivos não reconhecíveis, mas sintomas sob controle voluntário, como na simulação.

 

CLASSIFICAÇÃO: (segundo o DSM-IV)

a) Transtorno Esquizofrênico: é uma perturbação em que a psicose dura pelo menos 6 meses, incluindo pelo menos 1 mês de sintomas da fase ativa (que se caracteriza pela presença de dois ou mais dos seguintes critérios: delírios, alucinações, discurso desorganizado, comportamento amplamente desorganizado ou catatônico, sintomas negativos). Implica em um desempenho prejudicado das atividades do dia-a-dia (escolares, domésticas e do trabalho); ausência de síndrome depressiva ou maníaca completa (caso uma síndrome afetiva, geralmente depressiva, esteja presente, ela se desenvolveu após o surgimento dos sintomas psicóticos, ou então que a duração desta seja menor do que a da síndrome psicótica). Algumas alucinações específicas são muito sugestivas (em especial as auditivas), o afeto costuma estar embotado, e outros sintomas negativos podem estar presentes;

b) Transtorno Esquizofreniforme: é semelhante à esquizofrenia, porém com duração mais curta (de 1 a 6 meses) e não exige uma deterioração funcional tão acentuada quanto a esquizofrenia;

c) Transtorno Esquizoafetivo: é um diagnóstico de exceção, quando realmente não puder ser feito o diagnóstico diferencial entre esquizofrenia e transtorno afetivo maior com manifestações psicóticas, sendo uma perturbação na qual um episódio de humor e sintomas da fase ativa da esquizofrenia ocorrem juntos, precedidos ou seguidos de pelo menos duas semanas de delírios ou alucinações sem sintomatologia proeminente de humor;

d) Transtorno Delirante: delírios persecutórios, de ciúmes, hipocondríacos, somáticos, grandiosos, erotomaníacos ou outros. Os delírios não devem ser bizarros e devem durar pelo menos 1 mês, sem outros sintomas da fase ativa da esquizofrenia (não costuma haver alucinações e, se presentes, não são proeminentes. Também não há incoerência do pensamento ou afrouxamento das associações). O afeto está de acordo com o conteúdo do pensamento (desconfiança, raiva e hostilidade).

e) Transtorno Psicótico Breve: é uma perturbação psicótica que dura pelo menos 1 dia e tem remissão dentro de 1 mês, devida ou não a um importante fator desencadeante ambiental (morte de familiar significativo, importante mudança sócio- ocupacional, etc.) ou também com início no período pós-parto.

f) Transtorno Psicótico Compartilhado (folie à deux): o delírio desenvolve-se em um indivíduo no contexto de um relacionamento próximo com outro indivíduo que também apresenta o delírio, e na ausência de outro distúrbio psicótico (esquizofrenia ou transtorno de humor com sintomas psicóticos).

g) Transtorno Psicótico Devido a uma Condição Médica Geral: como o próprio nome diz, os sintomas psicóticos são considerados como decorrentes de uma condição médica geral.

h) Transtorno Psicótico Induzido por Substância: os sintomas psicóticos são considerados uma conseqüência fisiológica direta de uma droga de abuso, medicação ou exposição a determinada substância.

i) Transtorno Psicótico sem Outra Especificação: é uma categoria incluída para classificar os quadros psicóticos que não satisfaçam os critérios para as condições vistas acima, ou então para aquelas sobre as quais não existam informações em quantidade e qualidade necessárias para o diagnóstico.

CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS SOBRE A ESQUIZOFRENIA:

Também a esquizofrenia pode ser vista como uma Síndrome, já que engloba várias manifestações ligeiramente diferentes da condição básica. Assim, a expressão “Transtornos Esquizofrênicos” é mais adequada para representar um grupo de condições de diferentes etiologias. Acredita-se que múltiplos caminhos etiológicos possam ser responsáveis pelo fenótipo da Síndrome, sendo reconhecido o fator genético como o principal fator de risco para a condição (o risco populacional é de cerca de 1%, que é aproximadamente a sua prevalência, não variando muito geograficamente e mantendo-se relativamente constante ao longo de várias décadas, enquanto o risco da morbidade para um familiar de primeiro grau se encontra aumentado de 5 a 50 vezes; estudos com gêmeos mostram uma concordância de 10 a 19% para os dizigóticos e de 35 a 48% para os monozigóticos). Os fatores ambientais também se fazem presentes. Acredita-se que injúrias no período embrionário e também no período perinatal possam estar associadas à etiologia da esquizofrenia. Há uma maior prevalência de esquizofrenia nas classes sociais inferiores, o que pode ser tanto causa como conseqüência da doença.

Os sintomas característicos da esquizofrenia podem ser agrupados em positivos (floridos ou produtivos) e negativos (déficits). Os sintomas positivos são alucinações auditivas (mais frequentemente as táteis, visuais e olfativas são mais raras), delírios (persecutórios, de grandeza, de ciúmes, somáticos, místicos, fantásticos), perturbações da forma e do curso do pensamento (como incoerência, tangencialidade, desagregação e falta de lógica), comportamento desorganizado, bizarro, agitação psicomotora e mesmo negligência dos cuidados pessoais. Os sintomas negativos são pobreza do conteúdo do pensamento e da fala, embotamento ou rigidez afetiva, sensação de não conseguir sentir prazer ou emoções, isolacionismo, ausência ou diminuição de iniciativa e de vontade, falta de persistência em atividades laborais ou escolares e déficit de atenção. Esta classificação em sintomas positivos e negativos têm grande utilidade para o acompanhamento e manejo farmacológico dos pacientes.

A Esquizofrenia costuma ser classificada nos tipos Paranóide (com idéias delirantes de perseguição e grandeza proeminentes e alucinações correspondentes), Catatônica (com agitação e/ou estupor, que podem se alternar, além de negativismo e posturas catatônicas bizarras), Desorganizada (antigamente chamada de Hebefrênica, com extremo prejuízo no funcionamento social e pessoal, com marcada perda de coerência e associações, podendo apresentar maneirismos particulares), e um quarto tipo, chamado Indiferenciado, onde não se observa a predominância de nenhum dos três padrões anteriores.

O início da Esquizofrenia tipicamente ocorre entre o final da adolescência e os meadas da terceira década de vida, sendo raro o início antes da adolescência ou na velhice. Nas mulheres pode ser mais comum um início mais tardio, e também há maior propensão a sintomas proeminentes do humor, assim como a um melhor prognóstico. São considerados fatores de bom prognóstico: o início agudo dos sintomas e o curso episódico; o início tardio da doença; a presença de fatores precipitantes; a presença de sintomas afetivos; as formas Paranóide ou Catatônica e um bom funcionamento social e pessoal prévio ao acometimento. De outro lado os fatores de mau prognóstico são: início precoce e insidioso dos sintomas; ausência de fatores precipitantes ou de sintomatologia de humor; a forma desorganizada e personalidade esquizóide prévia ao acometimento da doença.

TRANSTORNOS PSICÓTICOS MAIS COMUNS POR FAIXA ETÁRIA:

Adolescência(11-18 anos)  - transtornos esquizofrênicos e psicoses reativas.

Vida Adulta (18-30 e 31-64 anos)  - transtornos esquizofrênicos e psicoses reativas, na primeira etapa; transtornos afetivos ou do humor, com sintomas psicóticos, na segunda.

Velhice (65 anos ou mais) - psicoses orgânicas (síndromes cerebrais orgânicas) e transtornos afetivos do humor (depressões).

panico2

Pânico

A característica essencial da Síndrome ou Transtorno de Pânico é a presença de Ataques de Pânico recorrentes e inesperados, seguidos por pelo menos  um mês de preocupação persistente acerca de ter um outro Ataque; preocupação acerca das possíveis implicações ou consequências dos Ataques; ou uma alteração comportamental significativa relacionada a esses Ataques. As Crises de Pânico são entendidas como intensas, repentinas e inesperadas, provocando sensações de mal estar físico e mental atrelado a um comportamento de fuga do local onde se encontra, seja indo para um pronto socorro, seja buscando ajuda de quem está próximo.

A reação de Pânico se torna uma reação normal quando existe uma situação que favoreça seu surgimento. Portanto, é normal sentir Pânico quando se está num local fechado onde tem início um incêndio, ou numa situação de afogamento ou, ainda, em qualquer outra situação com eminente perigo de morte. O Pânico passa a ser identificado como patológico e por isso ganha o título de Transtorno do Pânico quando essa mesma reação acontece sem motivo, espontaneamente. Nas situações em que a própria vida está ameaçada o organismo toma medidas que normalmente não tomaria, perdendo o medo de pequenos perigos para livrar-se de um perigo maior. Para fugir de uma cobra podemos subir numa árvore mesmo tendo medo de altura ou então fazendo esforços incomuns numa determinada situação e sofrendo pequenos ferimentos que no momento não são percebidos. O estado de Pânico é, portanto uma reação normal e vantajosa para a autopreservação. Aqueles que fogem mais rapidamente do perigo de morte têm mais chances de sobreviver.

O diagnóstico do Transtorno ou Síndrome do Pânico possui critérios bem definidos. Não podemos classificar como Transtorno qualquer reação intensa de medo. Assim sendo, segui abaixo os critérios usados para se fazer este diagnóstico:

a) Existência de vários ataques de Pânico no período de semanas ou meses. Quando houve apenas um ataque é necessária a presença de significativa preocupação com a possibilidade de sofrer novos ataques ou com as consequências do primeiro ataque. Isto é demonstrado pela preocupação com doenças, intenção de ir ao médico e fazer exames, vontade de informar-se a respeito de manifestações de certas doenças;

b) Dentre vários sintomas pelo menos quatro dos seguintes devem estar presentes:

1- Aceleração da frequência cardíaca ou sensação de batimento desconfortável;

2- Sudorese difusa ou localizada (mãos ou pés);

3- Tremores finos nas mãos ou extremidades ou difusos em todo o corpo;

4- Sensação de sufocação ou dificuldade de respirar;

5- Sensação de desmaio iminente;

6- Dor ou desconforto no peito (o que leva muitas pessoas a acharem que estão tendo um ataque cardíaco);

7- Náusea ou desconforto abdominal;

8- Tonturas, instabilidade de equilíbrio e sensação de estar com a cabeça leve ou vazia;

9- Despersonalização* ou desrealização**;

10- Medo de enlouquecer ou de perder o auto controle;

11- Medo de morrer;

12- Alterações das sensações táteis, como sensação de dormências ou formigamento pelo corpo;

13- Enrubescimento ou ondas de calor e calafrios pelo corpo.

*A despersonalização é uma sensação comum nos estados ansiosos que pode surgir mesmo fora dos ataques de pânico. Caracteriza-se por dar a pessoa uma sensação de não ser ela mesma, como se estivesse saindo de dentro do próprio corpo e observando a si mesma.

**A desrealização é a sensação de que o mundo ou o ambiente em volta estão diferentes, como se fosse um sonho ou houvesse uma nuvem.
Essas duas sensações ocorrem em aproximadamente 70% da população geral, não significando como ocorrência isolada uma manifestação patológica.

c) Há substâncias que podem gerar reações de Pânico semelhante às dos estimulantes. Quando isso ocorre, não se pode dar o diagnóstico de Transtorno de Pânico. Outra situação onde também não se pode determinar este diagnóstico é quando o ataque de Pânico se dá em decorrência de outros estados ansiosos anteriores, como um ataque secundário causado pela exposição forçada de um indivíduo que sofre de fobia social, por exemplo.

Trinta a cinquenta porcento dos pacientes que sofrem Transtorno de Pânico, acabam sofrendo de Agorafobia. Isso ocorre porque geralmente a pessoa associa as crises de Pânico a determinadas situações ou ambientes e passa a evitá-los com medo que deflagrem novas crises. Por exemplo, sair de casa sozinho. Se algum dia o paciente saiu de casa a pé ou de carro e passou mal no trânsito, evita sair desacompanhado. Precisa sempre de alguém de confiança por perto. Mesmo dentro de casa, se teve um ataque de pânico, dormindo ou enquanto tomava banho, não consegue mais ficar sozinho.

A Agorafobia pode impedir o paciente de ir ao trabalho, ao médico e de comparecer a ocasiões especiais.  Toda essa dificuldade só é superada pela companhia de alguém conhecido. Ás vezes basta uma criança como companhia para o Agorafóbico sentir-se tranquilo. Por causa dessa necessidade, a Agorafobia interfere diretamente na dinâmica da família. Mesmo em casa, há pacientes que não toleram ficar sozinhos, precisando ou exigindo a presença de alguém.

A incidência do Transtorno do Pânico é duas vezes maior sobre as mulheres em relação aos homens. A idade de início concentra-se em torno dos trinta anos, mas podendo começar durante a infância ou a velhice. Entretanto, a mulher na faixa etária dos trinta anos é o grupo sobre o qual se observa maior incidência desse Transtorno.

O tratamento mais recomendado para o bloqueio das crises são os Psicofármacos. Os Antidepressivos de todos os grupos e os Ansiolíticos são eficazes no controle das crises. Atualmente, mediante a disponibilidade de vários Psicofármacos, dificilmente um paciente não melhora com algum tipo de medicação. A Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) tem se mostrado eficaz para o tratamento, principalmente quando combinada ao tratamento medicamentoso feito por um Psiquiatra.

drogadicao2

Drogadição

O uso de substâncias que modificam o estado psicológico tem ocorrido em todas as culturas conhecidas desde a Antiguidade mais remota. Costumavam ser associadas a rituais tradicionais nas várias culturas. Um remanescente desse aspecto ritualístico do uso de substâncias mantém-se na igreja católica que segue usando vinho durante sua celebração.

Em sociedades modernas, especialmente as ocidentais, o uso descontrolado destas substâncias tornou-se um dos principais problemas de saúde pública. Praticamente todos já tiveram algum tipo de contato com cafeína ou nicotina (cigarros) e a grande maioria já experimentou álcool e boa parte dos jovens já experimentou canabinóis (maconha). As medicações obtidas sob prescrição médica, incluindo tranquilizantes e inibidores do apetite, também tem sido abusadas em grande escala.

É considerada substância psicoativa (drogas) qualquer substância que, utilizada por qualquer via de administração, altera o humor, o nível de percepção ou o funcionamento cerebral, podendo ser legalmente usadas, prescritas ou ilícitas (ilegais). No entanto, não existe uma fronteira nítida entre o que seja um simples uso de drogas, um abuso ou mesmo uma dependência severa pois tudo isto se desenvolve em indivíduos singulares. A condição clínica resulta da interação da substância com a vulnerabilidade fisiológica e social de cada um.

É importante registrar que, na maior parte das vezes, o início de uso de substâncias psicoativas se dá primeiramente no próprio lar, com substâncias lícitas e contando com a anuência implícita ou explícita dos pais. As comemorações familiares costumam oportunizar especialmente o uso de tabaco e de álcool, frequentemente presentes até mesmo em festas de primeiro ano de vida das crianças da família.

Na progressão, desde a experimentação até os problemas, a substância vai assumindo um papel progressivamente mais importante na vida do usuário. Suas atividades e seu círculo social vão ficando cada vez mais associados ao uso, surgindo, então, problemas de natureza familiar, sociais, legais, financeiros e físicos, entre outros causados pela droga.

Considera-se abuso de drogas quando o uso ultrapassa qualquer padrão social ou médico aceitos para o uso de determinada substância e, também, este uso passa a causar prejuízos a vida do usuário em um ou mais dos aspectos citados acima. Já a dependência ou uso compulsivo implica uma necessidade (“fissura”) pela droga, seja de natureza psicológica ou física. Neste último caso, o organismo da pessoa adaptou-se  à droga (tolerância) e apresenta sintomas quando de sua retirada.

Existe um número muito grande de substâncias psicoativas de uso corrente que podem ser classificadas de diferentes maneiras. Abaixo encontramos apenas informações sobre as drogas de maior significado pela frequência e disseminação de uso:

CANABINÓIS (MACONHA E HAXIXE)  

A Maconha (Cannabis Sativa) está entre as drogas mais usadas. O seu princípio ativo é o THC (delta-tetra-hidrocanabinol). Ele é extraído da planta pela queima das folhas, pequenos caules secos, flores e macerados. No Haxixe predomina a resina das flores, com elevada concentração do princípio ativo. Essas substâncias são preferencialmente fumadas. Seus efeitos físicos são taquicardia, olhos avermelhados, boca seca, tremores de mãos, além de prejuízo da coordenação motora e da força muscular.

Seus efeitos psíquicos são variáveis. Em geral provocam relaxamento, diminuição da ansiedade, aumento do apetite, euforia, alteração da percepção do tempo, cores, sons e do espaço. Em função disso, pode facilitar a ocorrência de acidentes automobilísticos graves.

Em doses mais altas podem ocorrer delírios, alucinações com perda do sentido de realidade, além de sentimentos de perseguição. É considerada, equivocadamente, uma droga leve. A dependência física é evidenciada na retirada, por alterações do sono, humor e desconforto muscular difuso. Seu uso crônico pode dar origem a um quadro clínico caracterizado pelo prejuízo da memória de fixação, causando desinteresse, desmotivação para a vida quotidiana com sérios prejuízos à integração social, escolar ou profissional do indivíduo. O usuário crônico costuma ter desempenho abaixo de seu potencial em todas as áreas da vida, mostrando-se como imaturo com relação ao esperado para sua idade.

ESTIMULANTES DO SNC (COCAÍNA, CRACK , ÊXTASE E ANFETAMINAS)  

Os estimulantes são substâncias cujo efeito predominante é o aumento da atividade do cérebro pelo bloqueio de células inibitórias ou pela liberação de substâncias neuro-transmissoras (substâncias liberadas por uma célula cerebral para comunicar-se com outras).

A Cocaína é obtida pelo processamento da folha da coca (ou Erythroxylum coca) e pode ter diferentes efeitos conforme a via de administração. A via intravenosa e o fumar (na forma de Crack) têm efeitos mais rápidos, intensos e fugazes do que a inalatória (cheirar). Seus efeitos físicos são aumento da pressão arterial, temperatura, tremor de extremidades e midríase (dilatação da pupila).

Os efeitos psíquicos são sensação de bem estar, euforia, aumento da autoconfiança, hiperatividade, desinibição, abolição da fome e da sensação de cansaço. Com aumento da dose aparece ansiedade, irritabilidade, apreensão, desconfiança, podendo chegar a delírios e alucinações tanto auditivas quanto visuais.

Em usuários crônicos foi descrito um quadro de letargia, hipersonia, irritabilidade, humor depressivo que, em casos graves, pode até chegar ao suicídio. A Cocaína desenvolve uma compulsão muito forte (“fissura”) nos seus usuários. No uso injetável pode causar arritmias cardíacas, convulsões, flebites, endocardites, além da contaminação pela AIDS e outras Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST), síndromes que são todas de elevada morbimortalidade. Por via nasal pode causar atrofia da mucosa nasal ou mesmo perfurações no septo nasal. No uso fumado (Crack), pode produzir lesões na orofaringe e aparelho respiratório, especialmente pela elevada temperatura do material de uso e da fumaça aspirada com avidez pelo usuário.

As Anfetaminas são também muito utilizadas sob forma de comprimidos anorexígenos, muitas vezes prescritos como coadjuvantes de tratamentos para emagrecer. Em geral, elas causam efeitos físicos e psíquicos semelhantes à Cocaína, podendo também desencadear ataques típicos de Pânico.

O Êxtase (ou Ecstasy)é um subtipo dos anfetamínicos relacionado a efeitos mistos de humor e de sensopercepção. Seu uso, em um modelo ritualístico contemporâneo, se disseminou através de festas dançantes com música eletrônica de longa duração ou Raves, seguindo um modelo semelhante aos tradicionais Kerbs, festas das colônias alemãs, que duram dias envolvendo muita dança e grande ingestão de cervejas, causando exaustão física e desidratação nos participantes. Indivíduos predispostos  podem sofrer Psicoses com o uso desta droga, assim como também pode ocorrer o mesmo com aqueles que chegam a doses elevadas. 

BENZODIAZEPÍNICOS E OUTROS TRANQUILIZANTES  

São os medicamentos mais prescritos atualmente no mundo todo, sendo utilizados como sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. A grande maioria dos pacientes clínico-cirúrgicos hospitalizados recebem essas drogas. São substâncias com utilidade clínica, porém, têm importante potencial para abuso porque apresentam tolerância, dependência psíquica e dependência física. Em razão de sua imagem de droga prescrita e benigna, sua represcrição informal na comunidade é muito frequente. A disseminação do uso se dá também pela disponibilidade dentro do lar, onde vivem jovens vulneráveis, muitas vezes administrados por familiares.

Seu efeito é a depressão do sistema nervoso central, caracterizando-se por sonolência, níveis variáveis de sedação e relaxamento muscular. Assemelha-se à embriaguez produzida pelo álcool. Provocam prejuízo da memória e do desempenho psicomotor. Em doses muito elevadas podem causar intoxicações com sedação acentuada, arritmias cardíacas e depressão respiratória. De acordo com o tipo e freqüência de uso que a pessoa faz, esse comportamento pode ser considerado como uso recreativo, uso abusivo e dependência.

O uso recreativo ocorre mais frequentemente na adolescência, quando o interesse por sensações e prazeres diferentes acaba fazendo parte do próprio desenvolvimento do adolescente, facilitando o contato com substâncias diferentes. O uso abusivo implica ao usuário se expor a riscos em decorrência do uso, busca ou efeito da droga, como por exemplo, dirigir sob efeito de álcool, que, além de ser crime, coloca em risco a sua vida e a de outras pessoas.

Quando o uso abusivo torna-se frequente a pessoa pode desenvolver um quadro de dependência, no qual a vida passa a girar em torno da obtenção e do uso da substância, deixando de lado atividades diárias como trabalho, família, eventos sociais e escola. A obtenção se dá muitas vezes em farmácias que vendem esses fármacos burlando a exigência de receitas médicas, implicando em transgressões.

Não existe tratamento universal para as farmacodependências, independente do tipo de droga. Nenhuma modalidade terapêutica mostra-se claramente superior para todos os pacientes. Entretanto, existem alguns princípios comuns que devem estar presentes em qualquer abordagem terapêutica, além da prescrição psiquiátrica de medicamentos específicos para cada caso, levando em consideração diversos fatores sociais, psicológicos e biológicos de cada paciente. Portanto, em caso de constatação de Drogadição, deve-se considerar a consulta a um Médico Psiquiatra.

insonia2

Insônia

A Insônia é um transtorno ou síndrome caracterizada pela dificuldade de INICIAR ou MANTER o Sono, ou ainda pela insatisfação com sua qualidade, o que resulta em sintomas diurnos, físicos e emocionais, do impacto no desenvolvimento das funções sociais e cognitivas.

Epidemiologia (quem pode ter Insônia?)

A incidência na população geral está entre 10,2% a 37,8%. Em São Paulo, no último EPISONO, a queixa em questionário ficou em torno de 45%. Mas, de fato, a Insônia Crônica, que é tratável, gira em torno de 10% a 15% da população geral.

O importante é diferenciar se a Insônia é primária (sem nenhum fator causador) ou insônia secundária (com um fator precipitante identificável) ou se ela é aguda (menor que 4 semanas), ou se já ficou crônica (mais de 3 meses).

A Insônia Primária mais frequente é a psicofisiológica, que está relacionada com um estado de HIPERALERTA ou HIPERVIGILÂNCIA do paciente, caracterizada por ansiedade relacionada ao ato de dormir. É o que nos acontece, por exemplo, nas noites de domingo para segunda-feira, em que não dormimos bem, pois estamos pensando nos compromissos do dia seguinte ou da semana que irá começar.

Das Insônias Secundárias (com algum fator gerador), destacam-se aquelas relacionadas a SAHOS (Síndrome da Apnéia/Hipopnéia do Sono), a transtornos mentais (depressão e ansiedade) e uso de medicamentos.

A SAHOS ocorre em 39% dos pacientes com Insônia, principalmente idosos e mulheres na menopausa. Na Depressão não se sabe se a insônia é causa ou consequência, porém esta presente em 90 a 93% dos casos de transtornos mentais graves.

Outras doença muito relacionada ao sono e a Fibromialgia.

Devemos também diferenciar a Insonia de outros transtornos do sono, como o atraso e avanço de fase e uso de medicamentos estimulantes.

Critérios gerais para Insônia (sintomas que identificam a insônia)

O diagnóstico de Insônia é baseado em uma série de sinais e sintomas clínicos. A Polissonografia só tem indicação para diagnóstico de exclusão ou para comorbidades (doenças associadas).

Os critérios gerais são:

A. Queixa de dificuldade para iniciar o sono ou para mantê-lo ou, ainda, despertar precoce ou sono cronicamente não reparador e/ou de má qualidade;

B. Os sintomas citados acima ocorrem mesmo havendo condições adequadas de sono;

 C. Presença das seguintes queixas relacionadas com as dificuldades de sono:

  • - Fadiga;
  • - Deficit de atenção, concentração ou memória;
  • - Disfunção sexual, profissional ou acadêmica;
  • - Irritabilidade;
  • - Sonolência excessiva diurna;
  • - Falta de motivação e energia;
  • - Propensão a erros ou acidentes de trabalho ou na condução de veículos;
  • - Cefaleia, tensão e/ou sintomas gastrointestinais;
  • - Preocupação com o sono.

Como fatores de risco para Insônia, podemos citar:

  •  - Ser do sexo feminino;
  • - Envelhecimento (a mulher após a menopausa terá a mesma incidência que nos homens). O idoso tem como associação a noctúria, muitos medicamentos, SAHOS e inatividade;
  • - Associação com transtornos mentais ou de doenças clínicas;
  • - Trabalho noturno.

Tipos de Tratamento

 Existem duas formas gerais de se tratar a Insônia Primária (pois na Insônia Secundária, será tratada a causa): a NÃO farmacológica e a farmacológica.

Tratamento NÃO Farmacológico

Chama-se TCC (terapia comportamental-cognitiva), que é a conduta padrão e tratamento de escolha em insônia primária, tanto isoladamente quanto na forma associada a terapia farmacológica.S

Tem baixo risco de efeitos colaterais e a manutenção da melhora no longo prazo, embora a resposta clínica seja mais rápida no tratamento medicamentoso.

A TCC tem um tempo limitado e definido, de quatro a oito sessões, e o paciente tem papel ativo e é corresponsável por seu tratamento. É baseado no modelo comportamental de Insônia que descreve os três principais fatores causadores da insônia: predisponentes, precipitantes e perpetuantes.

O principal instrumento da TCC é o Diário do Sono e é focada em sete fundamentos:

1. HIGIENE DO SONO

Intervenção psicoeducacional que contem informações básicas sobre sono e higiene do sono. Fazem parte das orientações dadas aos pacientes as seguintes instruções:

- Estabelecimento de horários regulares de sono;

- Não ir para a cama sem sono e tentar adormecer;

- Não passar o dia preocupando-se com a hora de dormir;

- Não ficar controlando o passar das horas no relógio;

- Evitar a ingestão de estimulantes (café, cigarro, refrigerantes “escuros”‘ e chocolate) próximo da hora de dormir;

- Jantar duas horas antes de dormir;

- Realizar atividades físicas regulares (pela manhã);

- Condições do quarto (conforto, temperatura, ruídos, silêncio, limpeza, organização).

2. TERAPIA DE CONTROLE DE ESTÍMULOS

Consiste em instruir o paciente a estabelecer um ritmo de sono/vigília mais adequado, limitando-se o tempo de vigília e os comportamentos permitidos no quarto/cama. Visa fortalecer as associações entre as pistas para um sono rápido e bem consolidado.

- Fazer da cama o local de dormir;

- Ir para a cama apenas quando estiver com sono;

- Evitar qualquer comportamento diferente de dormir ou fazer sexo no quarto/cama;

- Ao se sentir incapaz de dormir, levantar da cama e ir para outro ambiente, retomar alguma atividade relaxante em ambiente com pouca luminosidade e voltar para a cama apenas quando estiver sonolento;

- Manter horário fixo para acordar todos os dias;

- Não cochilar ou deitar durante o dia;

- Não se alimentar, ler, trabalhar, assistir a televisão ou usar computador no quarto/cama.

Recomenda-se que o paciente mantenha uma AGENDA DE PREOCUPAÇÕES, em que deverão ser anotadas diariamente, antes de sentir sono, todas as suas preocupações e pendências para o dia seguinte, aprendendo a tranquilizar os  seus pensamentos, substituindo os negativos pelos positivos.

3. TERAPIA DE RESTRIÇÃO DE TEMPO NA CAMA E DE SONO

Consolidar o sono por meio da restrição do tempo que o paciente passa na cama ao período médio de sono (horas que o paciente realmente passa dormindo), com base no Diário de Sono. Não se recomenda período inferior a quatro ou cinco horas de sono.

4. TÉCNICAS DE RELAXAMENTO

Deixar o paciente ciente da tensão e HIPERVIGILÂNCIA que mantém durante o dia e a noite.

Inclui uma variedade de técnicas. O relaxamento progressivo é o tratamento mais estudado. Outra técnica e o Biofeedback.

5. REESTRUTURAÇÃO COGNITIVA

Baseia-se nos sintomas cognitivos que podem ocasionar ou manter a insônia. Em geral os insones se preocupam com as consequências da insônia.

Leva o paciente a questionar a validade de suas crenças e/ou preocupações. Faz o paciente pensar que a maneira como pensamos ou julgamos os fatos é que determina o que sentimos.

6. INTENÇÃO PARADOXAL

Reduz a ansiedade antecipatória associada ao medo de tentar dormir e não ser capaz de fazê-lo. Instrui os pacientes a irem para a cama e se manterem acordados sem tentar adormecer . Isso é importante para deixar os pacientes mais relaxados e desobrigados do ato de dormir, fazendo com que o sono chegue mais cedo.

7. TERAPIA COGNITIVA NOS TRANSTORNOS DE MÁ PERCEPÇÃO DO SONO

Trabalha-se a relação entre a percepção subjetiva que o paciente tem do sono, comparada com o tempo total do sono, obtido por meio da Polissonografia. O objetivo é fazê-lo compreender que está dormindo mais do que consegue perceber.

Finalmente, avaliar com o paciente as técnicas que mais gostou e mantê-las, nunca compensando perdas de sono e, se a queixa de insônia for maior do que sete dias seguidos, então dar início à técnica da privação do sono.

Tratamento Farmacológico

Se estas técnicas não surtirem efeito, parte-se para o tratamento farmacológico. O mais comum é associar ambos tipos de tratamentos.

Como este texto tem por objetivo informar e esclarecer a população, o tratamento farmacológico será apenas citado.

Em hipótese alguma tente se auto-medicar! Somente um médico, de preferência especialista em psiquiatria, pode avaliar da forma correta o caso por inteiro e, havendo a necessidade e conhecendo o tipo biológico do paciente, poderá então prescrever a medicação e a dosagem mais adequada.

 Os Benzodiazepinicos, que no passado foram largamente utilizados no tratamento da insônia, hoje em dia não são mais prescritos com tanta frequência, por possuírem efeitos a médio e longo prazo de DEPENDÊNCIA, TOLERÂNCIA e SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA (na retirada abrupta).

O tratamento de escolha nos últimos anos são os Hipnóticos, em especial as “Z drugs”, Agonistas Alfa1 Seletivos, com baixo risco de efeitos colaterais, mas que devem ser tomados quando já se está na cama pronto para dormir, pois, caso contrário, podem levar a amnésia.

Outros tratamentos farmacológicos recentes incluem Antidepressivos Sedativos , Melatoninérgicos e a Valeriana.